terça-feira, 6 de julho de 2010

Taubaté - Templo Hare Crishna (Fazenda Nova Gokula)

Este foi um passeio que mais parecia um pesadelo, resultado da inexperiência dos participantes: eu e meu primo.

Éramos adolescentes quando começamos a nos aventurar em passeios de longa distância, a maioria por rodovias de fluxo muito baixo, quase inexistente. A grande maioria deles era nas proximidades de Taubaté - SP, pela facilidade de acesso que tínhamos. As bicicletas eram bem simples e baratas mas, felizmente, nunca nos deixou na mão.

Templo Hare Chrisna - Fazenda Nova Gokula (retirado do site Panoramio)


Interior do templo (retirado do site Panoramio)

Acordamos muito cedo naquele dia. O objetivo era ir até o templo Hare Chrisna na fazenda Nova Gokula que indicaram para nós. Tomamos nosso café da manhã, preparamos os lanches, pegamos um pouco de dinheiro e colocamos tudo nas mochilas. Não usávamos o tradicional uniforme de ciclismo mas sim bermudas, camisetas e tênis comuns. Nem sequer capacete usávamos naquela época, o que ilustra bem o nosso amadorismo (hoje em dia não saio mais sem capacete).

Não tínhamos muitas informações sobre o percurso e contávamos apenas com a coragem e o espírito de aventura, inerente dos adolescentes.

Tudo pronto, partimos com o nascer do sol, que estava espetacular naquele dia, prometendo ser inesquecível ... e foi.

Estação de Trem Campos do Jordão (retirado do site Panoramio)
Fomos até Pindamonhangaba pela Rodovia Amador Bueno da Veiga (SP 62). Em "Pinda", fomos até a estação do trem que vai para Campos do Jordão. Seguimos os trilhos do trem pela Rua Martin Cabral e depois viramos na Av. Dr. João Ribeiro.

Enquanto passávamos por uma fábrica da Coca-Cola, que hoje está desativada, fiz uma descoberta nada boa: "esquecemos as caramanholas no congelador". Nós colocamos as caramanholas no congelador, na noite do dia anterior, para manter a água gelada por um tempo maior e acabamos esquecendo de pegá-las pela manhã. Não valia a pena voltar e decidimos comprar água no caminho.

Rio Paraíba do Sul com a Serra da Mantiqueira ao fundo (retirado do site Panoramio)
Logo à frente cruzamos o rio Paraíba e então chegamos à Rodovia Dr. Caio Gomes Figueiredo (SP-132). Pedalamos mais uns 2 km e encontramos uma bifurcação. "E agora?", não lembrávamos direito o nome do local onde íamos mas vimos uma placa indicando Ribeirão Grande para a direita. Sabíamos que se continuássemos na rodovia acabaríamos chegando em Piracuama, então viramos à direita, na estrada Jesus Antônio de Miranda, sem muita certeza de estarmos no caminho certo. Pra falar a verdade a dúvida foi constante a partir deste ponto.

O dia já estava bem quente, com o sol muito forte. Quase não haviam nuvens no céu. O suor encharcava toda a roupa. Dava para ver o calor emanando do asfalto. Parecia até uma estrada do Vale da Morte, nos Estados Unidos, como nos filmes. Era um dia especialmente quente.

Em um certo momento paramos em uma casa de doces e compramos duas barrinhas de doce de leite. Na verdade o doce era só uma desculpa para filar a água do estabelecimento e descansar um pouco sob a sombra da grande varanda que lá tinha. Mais a frente paramos num bar para comprar água.

Passamos por um trecho com muitos Eucaliptos, que nos ajudaram a enfrentar o calor, com suas sombras.

Percorremos um pouco mais de 20 km desde "Pinda" e já estávamos morrendo de fome. O asfalto terminava aqui. O caminho continuava em frente mas resolvemos seguir um pouco por uma estrada à esquerda, até um bar. Abrimos a mochila e pegamos nossos lanches. Foi engraçada a cara que fizemos, um para o outro, quando vimos os lanches. Eles estavam finos como um pastel, compactados pelas outras coisas da mochila. Apelidamos o lanche de "pãoqueca".

Rio ao lado do bar, final do asfalto (retirado do site Panoramio)

Aproveitamos o rio que havia ao lado do bar para nos refrescarmos um pouco.


Após um ótimo repouso seguimos pela estrada que levava ao templo. Só tinha um problema ... não sabíamos o caminho e neste ponto já não tínhamos o asfalto para nos guiar. Começou a surgir uma bifurcação atrás da outra. Continuamos sem saber se estávamos no caminho certo, até que cruzamos o rio. A estrada se perdia entre o grande número de árvores e já desconfiávamos ter pego o caminho errado.

"No stress, sô aperreio", já sem dinheiro, depois de 40 km pedalados, decidimos voltar, mas não antes de aproveitar vários "single tracks" que haviam no local. Depois viemos a descobrir que o caminho era aquele mesmo e que quase chegamos lá, faltando apenas alguns metros.

O retorno até "Pinda" não teve surpresas, a não ser o cansaço que começava a nos dominar. Não estávamos habituados a longos passeios.

Já quase saíndo de "Pinda", em direção à Taubaté, encontramos uma bifurcação e uma placa de sinalização. Ela apontava para a direita, para Tremembé. Cansados, com nuvens negras no céu ameaçando uma enorme tempestade, seguimos rumo a Tremembé, achando que este seria o menor caminho de volta. Só tenho uma coisa a dizer: "Duas cabeças de jerico!". Com isso foram acrescentados 3 km ao nosso percurso.

Logo que entramos na rodovia, rumo à Tremembé, a tempestade começou. Ventava muito, e é claro, contra nós. As gotas de chuva eram enormes e chegavam a doer na pele. Não dava para enchergar nada à frente. Só desejávamos chegar em casa antes de uma possível chuva de graniso.

"Dinheiro, dinheiro ...", comecei a gritar, quando encontrei alguns reais perdidos a muito tempo, num dos bolsos da bermuda.

Com muito frio, cansaço e fome, chegamos à Tremembé. Paramos no primeiro bar que achamos e gastamos aquele dinheiro achado. Conseguímos comprar duas coxinhas. Irradiantes de felicidade por poder preencher um pouco daquele enorme vazio que tínhamos no estômago, pegamos o pote de catchup e apontamos para a coxinha: "peraí, este catchup está com uma consistência estranha". Pimenta, tinha acabado de encher minha coxinha com pimenta. Sem mais nenhum dinheiro para comprar outra coxinha, o jeito foi comer aquela mesmo. Pelo menos o frio se foi, ou a sensação dele.

Um detalhe interessante é que dentro do bar tinha uma cascata. Não era uma cascata artificial e sim um vazamento torrencial no telhado furado. Bem, estávamos ambos molhados mesmo ...

De Tremembé até Taubaté o percurso foi completado com muita cantoria, em voz alta, para espantar o cansaço.

"Home, sweet home", chegamos, no final da tarde. Nós estávamos imundos e sem energia pra nada, nem para um banho. A solução foi enfiar uma colher de açúcar na boca e dormir no chão duro do quarto. Sem travesseiro, sem cobertor, sem colchão e sem noção ... foi um dos melhores sonos que tive na minha vida.

Se fosse resumir este "passeio" em poucas palavras, eu diria: Calor, sede, fome, 81 km, cansaço, frio e muita diversão. Um pouco contraditório mas a mais pura verdade.

Publiquei o percurso no Wikiloc e no GPSies.

Mais informações sobre o local

A rodovia Jesus Antônio de Miranda, além de levar à várias atrações do Núcleo Turístico do Ribeirão Grande, como trilhas, riachos e cachoeiras ao pé da Serra da Mantiqueira, também é um roteiro gastronômico com comida caseira, peixes, massas, doces caseiros, etc. (fonte: Portalpinda). Estão previstas obras de recuperação na rodovia (fonte:Agoravale, 05/10/2009).

No site Pindavale há bastante informação sobre as várias atrações turísticas da região.

Taubaté é a cidade natal de José Bento Renato Monteiro Lobato. Na cidade, é possível visitar o Museu Monteiro Lobato.

A fazenda Nova Gokula tem um serviço de camping e hospedagem, mas atenção ao fato do lugar ter um clima de retiro espiritual. Se sua intenção é fazer bagunça com os amigos, não vá!

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